Uma fala pausada, paciente, explica os motivos que levaram àquele estalo em 2009. O juiz Cláudio Augusto Daltro de Freitas expõe com cuidado como se deu o nascimento de uma das mais bem-sucedidas experiências do Tribunal de Justiça da Bahia nos últimos anos.
Havia perguntas de difíceis respostas: como conviver com delegacias com carceragens superlotadas, demora na análise de autos de prisões e alto custo para o Estado? O Núcleo de Prisão em Flagrante, que em setembro de 2015 completa dois anos de criado, foi a solução encontrada pelo magistrado, à época juiz corregedor.
Hoje, aos 52 anos, titular da 1ª Vara de Família de Vitória da Conquista, no Sudoeste do Estado, ele vibrou com a implantação do Projeto Audiência de Custódia na Bahia, com direito à visita especial do ministro Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça.
“Temos que parabenizar os magistrados da Bahia que, pioneiramente, inauguraram esse projeto”, lembrou o ministro, em agosto, durante a instalação do projeto, um aprimoramento aos serviços já prestados pelo núcleo.
Cláudio Daltro reservou um tempo na atribulada agenda para falar ao site do TJBA sobre os primeiros passos do núcleo e do reconhecimento de uma ideia que está ajudando a mudar o sistema penal brasileiro.
Como surgiu a ideia no núcleo?
Juiz Cláudio Daltro – Primeiro era necessário fazer uma adequação para a análise da prisão em flagrante a partir da modificação, em 2006, do Código de Processo Penal, com a chamada Lei das Cautelares. Ela determinava a imediata necessidade de decidir os autos de prisão em flagrante. E, na época, nós verificamos que esses autos estavam sobrecarregando os plantões judiciários.
O núcleo também teve como objetivo reduzir a superpopulação carcerária.
Sim. Além da redução, tínhamos que tirar presos em flagrante de locais inadequados. A informação que temos hoje é de que não existem mais presos em delegacias. E a realidade era outra nas delegacias dos Barris, na Furtos e Roubos, situada na Baixa do Fiscal, e em Periperi, todas em Salvador. Isso ficou constatado no mutirão carcerário de 2009, o primeiro realizado em parceria com o Conselho Nacional de Justiça. O trabalho foi feito, durante 90 dias, na capital e nas cidades do interior com grandes carceragens. Em Salvador a situação era caótica com inúmeras prisões desnecessárias. Hoje o nosso núcleo ganha o reforço do projeto Audiência de Custódia. E a próxima meta é ‘zero preso’ na Região Metropolitana de Salvador.
E como foi o processo de criação?
Apresentamos, em 2010, o projeto ao Comitê Gestor do Sistema Carcerário do Estado, composto por representantes do Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Secretaria de Administração Prisional, Polícia Militar e Polícia Civil. O comitê entendeu que era uma política pública e as negociações avançaram. No mesmo ano enviei uma minuta do Provimento que criava o Núcleo de Prisão em Flagrante para o Paulo Sorci, que era juiz auxiliar do Conselho Nacional de Justiça e juiz corregedor do Tribunal de Justiça de São Paulo.
O senhor poderia apontar outros benefícios conquistados com o núcleo?
Outra preocupação nossa era com a economia. Um preso, naquela época, custava de R$ 1,8 mil a R$ 2 mil por mês ao Estado. Quando fizemos uma exposição ao governador sobre a instalação do núcleo também apresentamos o projeto de monitoração eletrônica, por meio de tornozeleiras eletrônicas, como uma alternativa à prisão. Dessa forma poderíamos realizar o efetivo controle, monitorar o preso provisório nas capitais. Hoje, o custo de uma tornozeleira é de R$ 300. A expectativa é que em breve o projeto seja instalado.
E como o senhor vê a implantação da Audiência de Custódia?
Na época da apresentação do nosso projeto não obrigamos a apresentação do preso. Porém, muitos juízes já faziam questão da presença do detido, o que configurava a audiência de custódia. É um avanço que irá tornar ainda mais eficaz o nosso núcleo.
Texto: Ascom TJBA